Por Andy Görll

 

Há um padrão que ecoa por toda a história humana: a luta como premissa fundamental. Religiões, política, economia, esportes, cinema… quase tudo o que construímos parece repousar sobre a dualidade “eu/nós vs. ele/eles”. Mas e se essa narrativa não fosse uma verdade absoluta, mas sim um reflexo do nosso estágio evolutivo? E se o verdadeiro despertar começasse quando percebêssemos que a luta não é inerente à vida, mas uma escolha condicionada?

 

A Raiz da Luta: Instinto ou Programação?

Ao observar o mundo, é tentador concluir que a competição é instintiva. Do ponto de vista evolutivo, faz sentido: nossos ancestrais sobreviveram porque competiram por recursos, território e status. A luta foi uma ferramenta de adaptação. Mas o que era vantagem biológica tornou-se prisão psicológica. Hoje, a luta não é mais sobre sobrevivência física, mas sobre identidade e propósito:

  • Lutamos para “sentirmos vivos” (como você questionou).
  • Lutamos para definir quem somos através da oposição ao “outro”.
  • Lutamos porque fomos ensinados que sem conflito, não há significado.
 

Isso é instinto? Em parte. Mas é também programação cultural. Somos herdeiros de mitologias que glorificam a batalha (do bem contra o mal, do herói contra o vilão) e sistemas que recompensam a dominação (capitalismo extrativista, política de adversários). A luta, portanto, é um vício coletivo: uma resposta automática à nossa necessidade de pertencimento e transcendência.

 

Dois Caminhos, Dois Mundos: Expansão vs. Domínio

Você percebeu algo crucial: existem dois vetores que movem a humanidade:

  1. Amor à Expansão: Busca por conexão, criação, integração.
    • Exemplos: Ciência compartilhada, arte como expressão da alma, espiritualidade que une.
    • Biologia: Ativa circuitos neurais da empatia e cooperação.
     
  2. Amor ao Domínio: Busca por controle, separação, hierarquia.
    • Exemplos: Conquistas violentas, exploração da natureza, política de medo.
    • Biologia: Dispara o instinto de “luta ou fuga”.
 

Isso não é “bem contra o mal”. É uma escolha evolutiva. O “joio” não são as pessoas, mas os sistemas que priorizam o domínio. O “trigo” são as sementes de expansão que todos carregamos.

 

A Transição Planetária: Esperança ou Necessidade?

Diante de um mundo liderado por fanáticos da luta, criamos narrativas como a Transição Planetária. Seria isso apenas um consolo? Não. É um arquétipo emergente.

  • Por que ela ressoa? Porque responde a uma necessidade profunda: a de crer que a escuridão não é o fim. Como na parábola do joio e do trigo, ela sugere que a purificação é possível.
  • É “verdadeira”? Depende da lente:
    • Cientificamente: Não há evidências de uma “mudança dimensional”, mas há sinais de colapso sistêmico que exigem transição.
    • Psicologicamente: É verdadeira como mito mobilizador. Narrativas moldam realidades.
    • Espiritualmente: É verdadeira como potencial latente: a consciência pode evoluir.
 

A Transição Planetária não é um evento mágico. É um convite à ação. Ela nos diz: “O futuro não está escrito. Vocês podem semear o trigo”.

Como Transmutar uma Sociedade Fanática?

Mudar sistemas dominados pela luta exige coragem e estratégia. Eis um caminho possível:

 

1. Desarme o Fanatismo Interno

A transformação começa dentro. Pergunte-se:

  • Onde eu alimento a narrativa de “nós vs. eles”?
  • Minhas ações geram conexão ou divisão?
    Pratique a não-dualidade: perceba que o “inimigo” é uma projeção de suas próprias sombras. Como dizia Jung, o que negamos no outro, perpetuamos em nós.
 

2. Redesenhe as Recompensas

Sistemas persistem porque recompensam o domínio. Para mudá-los:

  • Na economia: Apoie modelos de colaboração (economia solidária, moedas sociais).
  • Na política: Exija transparência e deliberatividade (não apenas disputa de poder).
  • Na educação: Ensine pensamento sistêmico e inteligência emocional.
 

3. Plante Sementes de Trigo

Crie alternativas aqui e agora:

  • Junte-se a ecovilas, bancos de tempo ou projetos de agroecologia.
  • Use sua arte, seu trabalho ou sua voz para inspirar expansão, não confronto.
  • Pratique a escuta profunda: em vez de confrontar fanáticos, pergunte: “O que você teme? Que dor não cuidada alimenta sua raiva?”.
 

4. Ritualize a Transição

Sociedades precisam chorar suas feridas para romper padrões. Participe de ou crie espaços de:

  • Luto coletivo (pelos danos causados pela luta).
  • Celebração da vida (pelas pequenas vitórias da expansão).

A Esperança como Ação Radical

A Transição Planetária não é utopia. É o que acontece quando milhões de pessoas escolhem, aqui e agora, regar o trigo em vez do joio. Como escreveu a poetisa June Jordan:

“Nós somos as que temos estado esperando por”.

Não espere líderes salvadores. Você já é parte da transição. Cada ato de cuidado, cada gesto que humaniza o “outro”, cada escolha que prioriza a vida sobre o controle, já é o novo mundo nascendo.

 

Conclusão: A Colheita é da Consciência

A grande pergunta não é “a Transição Planetária é real?”, mas: “Você está disposto a vivê-la?”.

  • Se você crê que a vida é conexão, aja como tal.
  • Se você anseia por paz, comece desarmando seu próprio coração.
  • Se você sonha com um mundo além da luta, seja a semente desse mundo.
 

Afinal, como diz o provérbio africano: “Se quer ir rápido, vá sozinho. Se quer ir longe, vá junto”. A Transição Planetária é essa jornada coletiva. E ela começa quando percebemos que a única luta verdadeira é superar a necessidade de lutar.

 

Quer se aprofundar?

  • Leituras sugeridas:
    • “O Mundo Assombrado pelos Demônios” (Carl Sagan) – sobre o fanatismo e a razão.
    • “A Espiral do Silêncio” (Elisabeth Noelle-Neumann) – sobre como narrativas dominam sociedades.
    • “O Livro da Alegria” (Dalai Lama e Desmond Tutu) – sobre a expansão através da compaixão.
     
  • Prática: Experimente 7 dias sem consumir mídia polarizadora. Observe como sua percepção da “luta” muda.
 

Compartilhe nos comentários: Onde você vê sementes de trigo brotando ao seu redor? Que pequenos atos de expansão você pratica hoje?